A Ribeira de Muge fica situada na orla de um dos maiores desertos humanos de Portugal, a floresta de Entre-Muge-e-Sorraia. Esta região pode exibir ainda hoje uma cultura com traços característicos muito próprios, mormente a rude cultura dos pastores, cabreiros e dos negros que aqui habitaram. São estas especificidades que a Academia persegue, "subindo ao povo", como nos diz o grande Pedro Homem de Melo, recolhe, estuda e divulga.

sábado, 21 de março de 2015

Dia Mundial da Poesia I - Zé Moira


Vim parar ao Vale da Lama
Para me fornecer de capitais
Entre matos e chaparrais
Imito a fraga africana

Eu tenho tantas farturas
Sem conhecer o dinheiro
Por falta de candeeiro
Deito-me sempre às escuras

Tenho portas sem fechaduras
De palhas é o telhado
Tenho um tecto envernizado
Com fumos de várias cores
Neste jardim de flores
Estou deveras encantado

Eu nunca posso usar
Casaco nem sobretudo
A mim me faz falta tudo
Pois assim é que é gozar

Uma esteira para me deitar
Por não ter outra cama
Era uma pobreza franciscana
A minha roupa são farrapos
Os meus companheiros são gatos
Porque habito numa cabana

O meu calçado fino é
Foi feito por um vaqueiro
As solas são de salgueiro
Que mal posso andar de pé

Ainda não perdi a fé
De comprar um vestuário
E umas lindas alpercatas
Para dar ligeiro de patas
No deserto solitário

É um signo de mau porte
E com ele temos que seguir
E assim temos de cumprir
Cada um com sua sorte

Eu fugi a este golpe
Para ver se ninguém me chama
Vim esbarrar ao Vale da Lama
Para me fornecer de capitais
Entre matos e chaparrais
Imito a fraga africana.

Recolhido junto de Norberto Evangelista por Manuel Evangelista. 

domingo, 15 de março de 2015

O Terreiro do Paço e os pinheiros da Várzea do Pinhal, nos Gagos.

Um relato sonoro de um homem que nasceu em 1915, Rafael Roberto, um sábio, que ilustra o tema desta foto que com a devida vénia, partilho: O transporte de pinheiros, no início dos anos 20, do século passado, de Gagos na ribeira de Muge, para o Tejo, em carros de bois, e daí para o Terreiro do Paço, em Jangadas. Clique para ouvir (2 minutos):

https://dl.dropboxusercontent.com/…/O%20Porto%20do%20Mijado… 

Com a devida vénia, foto de Hélio Matias, de Vallado dos Frades. (facebook)                    

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

A capela de S. João Baptista CONT.


Foto de 2004 do livro Lendas da Ribeira de Muge,


Frente da capela de S. João Baptista – Pode ver-se a porta entaipada.

Atulhada numa lixeira, aquela era a porta da Capela quinhentista, de S. João Baptista, que teimava em resistir.

Em 2005, cerca de 20 anos após ter sido adquirido o espaço, pela Câmara municipal, foi um grupo de cidadãos da terra, encabeçados e organizados pelo Dr. Aquilino Fidalgo, que teve a visão e a coragem de transformar aquela lixeira, num espaço histórico e cultural agradável, mágico e cheio de simbolismo.



As realidades devem ser ditas: a câmara, sempre atenta e pronta a aproveitar-se do trabalho dos outros em seu proveito, mas sempre, e até hoje, fugindo à sua responsabilidade de classificação deste monumento concelhio, a três meses das eleições, em Julho de 2005 consegue fazer algumas obras, como colocar uma porta de alumínio. Em 2007/08 um reboco em cimento.

Festa, 02-07-05



Hoje esta capela, que é o berço de Paço dos Negros, tem um aspecto exterior um pouco mais cuidado, mas o telhado, 30 anos após a dita aquisição, continua como se vê na foto abaixo, a permitir que entrem os pássaros e a chuva. Urge dignificar o mais simbólico monumento de Paço dos Negros.

sábado, 14 de fevereiro de 2015

Dia dos namorados

Não é só em Vieira do Minho. Em Paço dos Negros também há lenços de namorados.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

D. Sebastião no Paço da Ribeira de Muge - 443 anos


Escudo frontal do portal do paço da ribeira de Muge


Com a morte de D. João III, em 1557, a assiduidade ao Paço da Ribeira de Muge pela rainha D. Catarina e pelo rei D. Sebastião manter-se-á, como o provam as suas longas estadias nos paços de Almeirim.
Padre Amador Rebelo, 1532-1622, in Relação da vida d’el-rei D. Sebastião, (em Francisco Sales de Mascarenhas Loureiro), diz-nos que em questões de preferência, em três lugares onde tinha seus paços reais, onde D. Sebastião costumava ordinariamente residir, era Almeirim o primeiro.
Muitas são as histórias do rei D. Sebastião nas caçadas, nas coutadas de Almeirim e da Ribeira de Muja, conforme documentos, e sugerem as fugas a sua avó durante as suas longas estadias nos paços de Almeirim. São conhecidas as várias histórias de quando adolescente, o Rei Menino, passou em Almeirim excelentes férias e muitas aventuras, de tal modo se apegou a esta sua Vila Real que, como nenhum outro rei seu antecessor, aí se demorou como soberano durante longos e frequentes períodos. No Paço se atinha e governava e nos campos e bosques monteava com destreza, por vezes não muito prudente.
Causando preocupações à avó, a rainha D. Catarina, se embrenhava nos matagais das coutadas de Almeirim e Ribeira de Muge. Aquela em que aos 11 anos se atreveu a varar um javali, salvando da morte o seu aio, D. Aleixo de Meneses:
(Henrique Leonor Pina): «Partido de Almeirim manhã cedo, D. Sebastião e a sua comitiva de caça, viram nascer o sol já avistado o Convento da Serra. Desceram no sentido leste, do Paço da Ribeira de Muge, eis quando, nas Ferrarias, se levantou um poderoso javali. Com decisão o rei apontou a choupa ao pescoço da fera e cravou certeiramente a arma entre o peito e a omoplata. Surpreendida, a fera ainda tentou morder os corvilhões do cavalo. Era o seu primeiro javali. Uma presa real. Refeita do susto, a comitiva cercou e cumprimentou D. Sebastião que ordenou que seguissem para o Paço dos Negros, onde se jantou*.» 
* Ao jantar daquele tempo, cerca do meio-dia, corresponde hoje o nosso almoço.

De D. Sebastião se relatam alguns casos bem estranhos. Ainda dos escritos de Padre Amador Rebelo, (idem), o caso do rei que mostrou ter “boa boca”:
«Aconteceu uma vez que estando em Almeirim, foi com a sua comitiva a monte ver se matava um javali, que lhe tinham emprazado. Havia mandado levar o jantar. Para não errar o lanço do porco, começou el-rei a correr após ele, e correndo por muito tempo, perdeu-se.
Não tomando o caminho, ele e um fidalgo que com ele estava, subiram a um monte, e avistando um pastor com suas cabeças de gado, este lhes indicou o caminho para Almeirim, longe que estavam. Como apertava a fome com el-rei, era tarde e não tinham jantado (almoçado), disse para o pastor, tendes aí um pedaço de pão que me deis? O pastor respondeu que só um muito duro e preto, que não é para vossa mercê, que não conhecia el-rei. O rei pediu que o partisse com ele, e o comeu com tanto gosto, que disse depois que nunca em toda a sua vida comera coisa que melhor lhe soubesse.»
As fugas nocturnas à avó, a rainha D. Catarina. O caso em que posto em cima de uma árvore, esperava um javali, viu um vulto, e descendo com pressa, investiu com ele, era um negro boçal** que tinha fugido:
«Saía de noite às dez horas a passear à praia só sem companhia, e no bosque de Sintra do mesmo modo. Esperava em Almeirim posto sobre uma árvore um javali, e aplicando a vista viu um vulto, e descendo-se com pressa investiu com ele: ao estrondo acudiram alguns monteiros, imaginando seria fera; acharam porém o Rei lutando com hum negro boçal, que havia largos dias que fugindo a seu amo, habitava com as feras daquele monte.» (António Caetano de Sousa, Do rei D. Sebastião, cap. XVII).

Mas uma data concreta em que D. sebastião esteve neste Paço encontramo-la em (A. Simancas, Estado, legajo 390, f. 88, citado em Joaquim Veríssimo Serrão, Os itinerários de D. Sebastião, 1568-1578):
Quando uma vez, aos 17 anos, estava o rei D. Sebastião em Almeirim desde 21/12/1571, uma carta de 10/02/1572, do cardeal a Dona Catarina, que estava em Lisboa, diz que D. Sebastião passou alguns dias no Paço da Ribeira [de Muge]: «elRey meu sor esta muito bem. não se lhe deve dizer algua cousa que de algua sospeita. E elRey meu sor esta nos Paços da Ribeira e não a de vir senão amanhã a noite. E também esta para ir ver V. A. logo na entrada da coresma.»